quinta-feira, 12 de julho de 2012

"Não sobre rouxinóis": Teatro visceral brilha no Rio de Janeiro com texto de Tennesse Williams

Em cena, Éber Inácio, Bruno Ferrari e Alexandre Mofati.
Cefas Carvalho

Este blogueiro cinéfilo pede licença aos leitores para deixar de lado a sétima arte neste post para falar sobre teatro. Em recente viagem ao Rio de Janeiro consegui fugir das dezenas de comédias (refinadas ou besteirol) e comediantes stand-up que infestam a Cidade Maravilhosa e as demais capitais, para assistir a um drama. Mais que isso, um drama de Tennesse Williams, sim, aquele mesmo, o dramaturgo americano de "Um bonde chamado desejo" e "Gata em teto de zinco quente" entre outros tão conhecidos por cinéfilos e amantes do teatro. Ou seja, o terreno teatro-cinema aqui é tênue e felizmente, desbravável.
Trata-se do espetáculo "Não sobre rouxinóis", ainda em cartaz para os sortudos cariocas na sala Paulo Pontes, no Teatro Net, no Shopping dos Antiquários, em Copacabana. Dirigida por João Fonseca e Viniciús Arneiro (tradução de Eduardo Rieche, também ator na peça), a peça foi escrita por Williams em 1938 quando o autor contava apenas 27 anos (mas montado pela primeira vez apenas em 1998!) e versa sobre um fato real: a revolta de presos contra as condições subhumanas do presídio e a postura ditatorial do diretor.
Claro que em se tratando de Williams, as relações humanas e a tensão sexual ganham espaço. E são elas que pontuam a trama, que trata basicamente das reivindicações do líder dos detentos Butch (Bruno Ferrari) por melhor comida e bons tratos em um presídio, confrontando Whalen, o diretor mau caráter e sádico  que "disputa" a recém-contratada secretária Eva com o detento-secretário  "Canário" Jimmy, conhecido como delator entre os demais presos. Este ponto de partida leva a trama e os personagens às consequencias extremas.
Não sendo crítico de teatro e assistindo a peça com o olhar passional já conhecido pelos leitores do blog (devoto que sou de Lynch, Bergman, Honoré e tantos outros) não me atreveria jamais a apontar que este ou aquele ator se destaca ou que a direção acerta nisso ou naquilo. O fato é que a visceralidade da peça chama a atenção e tudo parece fiuncionar: direção, cenografia, sonoplastia etc. O elenco  - todo ele excelente - é formado por Nilvan Santos, Adriana Maia, Júlia Marini, Eduardo Rieche, Thelmo Fernandes, Cleiton Rasga, Éber Inácio, Alexandre Mofati, Sérgio Ricardo Loureiro, Alex Nader e César Amorim.
A proximidade do palco com a platéia (poucos centímetros entre o limite do palco e primeira fila) faz com que o espetáculo ganhe ares angustiantes, já que muitas cenas envolvem tortura física (há psicológica também, em grandes quantidades), confinamento e sensação de calor. Muita gente na platéia - nitidamente experimentada em dramas pesados - se mostrou desconfortável com o que se passava no palco. Nada melhor para quem, como este blogueiro, sonha com peças, filmes, músicas e livros que me tirem da zona de conforto e me lembrem sempre que a vida é algo nebuloso e sombrio, cheio de som e de fúria, como diria Shakespeare.
O título da peça é explicado em um diálogo entre Jimmy e Eva na qual o primeiro cita o poeta inglês Keats, criticando uma famosa obra do poeta (Ode a um rouxinol) e defendendo uma posição filosófica do mundo que muito parece com a deste blogueiro. Quem quiser que fale sobre rouxinóis ou teça odes sobre flores, passarinhos ou cachoeiras (ops!). A peça em questão é sobre dor, encarceramento, desilusão e morte. Temas que merecem ser discutidos e analisados neste mundo cão de hoje em dia, neste Brasil velho de guerra, tão bruto e cruel como os EUA da depressão da década de 30, no mundo sempre esquisito e cru do mestre Williams.

Nota do blogueiro: Fatalmente o espetáculo citado estaria entre as prioridades para se assistir no eixo Rio-São Paulo, mas o fato é que foi o amigo César Amorim fazer parte do elenco quem me fez saltar os olhos para a peça, ainda em terras potiguares, e a ele agradeço a atenção, o carinho e a simpatia, assim como a de todo o elenco do espetáculo. Pena que, como conversei com o elenco após o espatáculo, uma peça dramática com 12 atores dificilmente conseguirá fazer turnê que chegue às capitais nordestinas. 

2 comentários:

  1. Sou fã de Tennesse, mas não conheço esse texto dele. Vc teria uma cópia, Cefas?

    O Falcão Maltês

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  2. Amigo, pedi uma cópia a um dos atores. Estou esperando a resposta. Em ele me enviando, lhe repasso imediatamente. Abraço!

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