quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

"A grande beleza": Uma grande surpresa feliniana que coloca o cinema italiano nos seus melhores dias


Cefas Carvalho

Elogiado no Festival de Cannes, vencedor dos principais prêmios do European Awards (filme, diretor e ator), pré-candidato ao Oscar de filme estrangeiro com jeitão de favorito, "A grande beleza" surgiu para mim como uma grande surpresa. Descrente do cinema italiano há umas boas décadas (apesar dos acertos ocasionais de Nanni Moretti, Pupi Avati e Giuseppe Tornatore), já tinha conhecido a obra de Sorrentino no bom "Il divo" e há muito tenho vontade de assistir "Aqui é o meu lugar", com Sean Penn. Mas, nada do que eu havia lido sobre o cidadão garantiria que "A grande beleza" - que assisti mais pelos prêmios a qual estava e está concorrendo - fosse me encantar. Contudo, foi exatamente o que ocorreu. Se de início, Sorrentino recorre a imagens desconexas e colagens (que poderia resultar em uma pseudo intelectualidade ou em tédio), o filme logo mostra ao que veio, ao nos mostrar, em conta-gotas, a realidade de Jep Gambardella, escritor que lançou seu único e excelente romance 40 anos atrás e que encara com tédio e humor ácido a "dolce vida" que leva entre festas, amigos e mulheres. Tudo isso narrado com o olhar felliniano de "A doce vida" e "Oito e meio", em um raio X atualizado das superficialidades e idiossincrasias da classe alta romana. Consciente da superficialidade de sua vida, Jep se agarra a fatos corriqueiros (um quase romance com a filha stripper de um amigo dono de cabaré, a evocação de um amor adolescente do passado) para retomar às ambições e quem sabe escrever novo livro. As incursões de Gambardella pelas ruas (turísticas ou bizarras) de Roma são das melhores cenas do filme, que, em meio à tanto tédio e superficialidade dos personagens, se mostra humano e profundo no sentido de analisar o que leva cada um a escolher a vida que tem. Uma pergunta que Jep parece se fazer implicitamente durante o filme inteiro. Dia desses, "A grande beleza" ganhou o Globo de Ouro de filme estrangeiro e parece ter tudo para vencer também o Oscar da categoria. O que seria merecido pela qualidade do filme em si, pela revisita ao universo de dois clássicos de Fellini e pela capacidade retomada e antiga do cinema italiano de ter uma visão apurada sobre sua própria cultura.

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